General Info
Ao iniciar o Doutorado, me propunha a estudar o fenômeno da cada vez mais comum vigilância por câmeras no espaço público urbano, que começava a ser oficialmente empregada como parte de uma nova política pública de segurança, sendo a tarefa atribuída à Polícia Militar. O discurso de inauguração da então governadora Rosinha Garotinho, em junho do ano anterior, anunciava que o investimento em tal aparato técnico marcaria o início de uma nova fase de combate à criminalidade, dando provas da integração cada vez maior ao "mundo moderno das polícias inteligentes" 1. Tinha a chance então de pesquisar a implementação de uma "idéia inovadora" 2, confrontar o discurso ideal com a realidade material, e foi com esse espírito que iniciei esta caminhada. Apesar de muitas idas e vindas, percalços e mudanças de direção, pistas esvaziadas e certezas desfeitas, imagino ter, em algum grau, operado essa confrontação. Entretanto, como fica evidenciado no texto que se segue, não me concentrei sobre questões de eficiência ou avaliação de políticas públicas, até por não me considerar capaz de fazê-lo. A videovigilância policial, além de um fenômeno recente, está longe de ser algo fixo. As experiências que me propus a estudar, até por estarem baseadas essencialmente em inovações tecnológicas, ainda buscam a melhor forma de adaptar a ação e o contingente humano a essas inovações. Ou ao menos deveriam, e esse sim é um assunto a ser debatido ao longo do texto. De qualquer modo, estudos semelhantes têm por característica a possibilidade mais que concreta de serem rapidamente suplantados por uma reviravolta qualquer, seja na elaboração das políticas de segurança, na sua execução, ou por um desenvolvimento insuspeito dos meios técnicos. Assim, é preciso adiantar, não tenho pretensões de proferir grandes verdades, desvendar algum tipo de realidade ou fazer previsões. Busco apenas refletir sobre alguns aspectos do mundo no qual vivo (e me interconecto) cotidianamente, e que vêm já há algum tempo me chamando a atenção e despertando a curiosidade. Em especial transformações na forma de nos relacionarmos com as imagens, com os outros e com o espaço urbano, através dessas imagens e dos meios técnicos que possibilitam essas relações, da maneira em que ocorrem. Apesar de buscar inserir a discussão em um contexto muito maior, fora do qual seria impossível compreendê-la e perceber a riqueza que traz em si3, é em experiências locais e concretas que a presente tese mantém-se ancorada. A inserção dessas experiências nesse contexto, assim como desse contexto amplo e difuso nessas experiências reduzidas, são os principais objetivos que me propus. Longe da simplicidade que à primeira vista pode aparentar tal tarefa, além de extenuante, revelou-se pródiga em armadilhas e dotada de consideráveis propriedades labirínticas. Policiamento, (in)segurança, tecnologia, imagem, comunicação, informação, poder, crime, violência, espaço público, controle, voyeurismo, criação, exibicionismo...