Informações Gerais
O objeto de pesquisa desta dissertação delineia-se a partir de uma singela, mas poderosa pergunta: como são tratados os internos do manicômio judiciário? O tratamento da medida de segurança ao mesmo tempo que renova as possibilidades dos internos em narrarem a si mesmo, os inscreve no paradoxo institucional do manicômio judiciário em que são confusas as fronteiras entre controle e cuidado, desejo e poder. O processo de ressubjetivação que o tratamento possibilita ao preso em cumprimento da medida de segurança opera através de enquadramentos que mudam o regime de inteligibilidade desses sujeitos renovando, assim, as formas como eles são reconhecidos. Estes enquadramentos, engendrados pelo dispositivo do tratamento, operam a partir da conversão do “sujeito incriminado” para “doente mental” e do “interno” para “paciente”. No entanto, essas passagens são constitutivamente liminares, isto é, nelas há a impossibilidade da concretização plena da transição de um registro de inteligibilidade a outro. A passagem nunca simplesmente passa. O “louco-criminoso” parece dividir-se em: “em tratamento” e “não-em-tratamento”, nessa divisão encontra-se suspenso o estado: “tratado”. A suspensão liminar que caracteriza o tratamento é, enfim, também seu ponto irresoluto de inarticulação, pois o período liminar não é superado, mas reiterado a cada “surto”. O preso considerado louco é convertido em doente mental e torna-se, sobretudo, tratável (portanto, internável e reinternável). Nesse sentido, o tratamento-compulsório da medida de segurança, para os envolvidos em sua gestão, seria capaz de, ao dividir os internos entre “recuperáveis” e “irrecuperáveis”, “estabilizados” e “instáveis”, operar a partir da conversão do interno em “paciente” sua reconversão em “sujeito de direitos”. No entanto, se por um lado essa primeira conversão não deixa de produzir restos disciplinares, por outro a reconversão não cessa de gerar efeitos inesperados sobre os familiares obrigados a cuidar do preso desinternante.